Inovação é um elemento estratégico para qualquer companhia atualmente, e as startups são fortes concorrentes das empresas tradicionais nesse quesito. Mas enquanto alguns setores tentam combater as novidades – alô, empresas de benefícios –, o mercado de seguros tem ido na direção contrária, aliando-se aos novos players e às startups para inovar de maneira eficiente.
“Há algum tempo, essa parceria com as startups era vista de forma experimental, mas hoje em dia é algo que se vê com bastante naturalidade na nossa estratégia do dia a dia”, conta Guilherme Jun Haraguchi, superintendente executivo de Inovação do Grupo Bradesco Seguros. “Ainda mais em um mercado complexo como o nosso, que trata desde o nascimento até o último momento de vida do segurado. Seria muita pretensão achar que a gente teria as soluções para todas as necessidades dos nossos clientes, tendo um rol tão grande de produtos”.
André Vasco, diretor de Serviços às Associadas da Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg), afirma que a inovação permite a criação de vantagens competitivas, impulsionando o crescimento e a sustentabilidade dos negócios. Segundo ele, a necessidade de investir em tecnologia foi intensificada com a pandemia da Covid-19, quando as seguradoras aderiram ainda mais aos processos de digitalização, permitindo, por exemplo, que notificações e até vistorias fossem realizadas de forma virtual, prática que permaneceu até hoje.
O porta-voz da Bradesco Seguros também ressalta que o programa de inovação aberta ganhou mais tração com a pandemia, e que vem crescendo conforme o próprio ecossistema de startups se desenvolve. “O programa ganhou força nos últimos cinco anos. Já prospectamos mais de 400 possíveis soluções e hoje podemos dizer que temos inovações implementadas em todas as áreas da empresa que são fruto de colaborações com startups, inclusive no processo de comercialização e no pós-venda”, afirma.
Tendência de mercado
Analista da Levante Corp especializado em seguros, Matheus Nascimento explica que as seguradoras que investem em inovação tendem a registrar crescimento mais acelerado. Para ele, os programas de inovação aberta são hoje um dos principais diferenciais competitivos dessas companhias.
“Essas companhias se aproveitam do tamanho delas no mercado para abarcar novas empresas que podem agregar valor. São business que têm um potencial enorme de geração de receita, e a parceria agiliza muito o processo. Se a empresa fosse desenvolver aquela inovação por conta própria teria que fazer recrutamento, estudar mercado, a curva de rentabilidade seria mais longa”, explica o analista.
Entre as seguradoras que possuem programas de inovação aberta, ou seja, de parcerias com as startups, estão a Porto Seguro e a Brasilseg, do grupo BB Seguros. Não por acaso, ambas são negociadas na bolsa de valores brasileiras, a B3.
“As empresas listadas em bolsa precisam ter um certo nível de capitalização, de forma que seu volume financeiro acaba sendo mais alto que o dos pares não listados. Além disso, elas também têm que cumprir certas exigências de governança. O fato de essas duas empresas investirem em inovação aberta é positivo para o mercado porque acaba ditando uma tendência”, aponta Matheus.
IA e tokenização
A Porto criou a Oxigênio Aceleradora em 2016, e desde então já realizou 18 ciclos de aceleração, além de maratonas de inovação e gincanas tech. Atualmente, a seguradora faz cerca de cinco a seis acelerações por ano, e para cada uma recebe cerca de 300 inscrições, como conta Maurício Martinez, gerente de Pesquisa e Desenvolvimento da Porto e Oxigênio.
Hoje, a Porto é dividida em quatro verticais, para além da holding (Porto Bank, Porto Saúde, Porto Seguro e Porto Serviço), o que exige soluções inovadoras nas mais variadas frentes. “A Porto não é só uma seguradora, temos 28 empresas. Tem cartão de crédito, consórcio, a gente arruma aquecedor, instala ar-condicionado, faz gerenciamento de guincho. Tudo que possa imaginar, a gente tem. A gente se coloca cada vez mais como uma life tech. Então tem espaço para startups de todos os segmentos, não apenas insurtechs”, ressalta Maurício.
Segundo ele, o foco neste ano é em inteligência artificial generativa (GenAI) e web 3.0. A ideia, neste primeiro momento, é desenvolver soluções de GenAI que possam ajudar os próprios colaboradores a reduzir o tempo gasto com atividades de pesquisa, por exemplo. “Com o Drex também temos olhado para a tokenização com bastante carinho, especialmente no que diz respeito aos smart contracts”, antecipa o executivo.
Investimento em tecnologia
No balanço do quatro trimestre de 2023, a BB Seguridade informou ter investido R$ 587,6 milhões para acelerar a infraestrutura de cloud, além de maturidade analítica, experiência do usuário (UX), canais digitais e portfólio. A Brasilseg, por meio do programa de inovação aberta Impulso Open, já estruturou mais de 30 projetos piloto com o objetivo de resolver desafios estratégicos da companhia de forma ágil e inovadora com parceiros externos.
“Iniciamos a operação do programa em 2021 e consideramos essa uma excelente oportunidade para as startups brasileiras estabelecerem conexões com a Brasilseg. Essa abordagem também impulsiona internamente inovações relacionadas aos produtos e ao leque de opções da empresa”, diz Mariana Santana, gerente de Estratégia, Inovação e Inteligência de Mercado da Brasilseg, uma empresa BB Seguros.
Entre as soluções que surgiram por meio da parceria com startups estão um sistema de gestão da inadimplência no seguro de vida e uma ferramenta de modelagem de risco no seguro agrícola. Também foram implementadas parcerias rurais com a plataforma Broto para ofertar soluções inovadoras para os produtores rurais e para otimização de processos da própria plataforma.
Parcerias estratégicas
A relação entre as startups e seguradoras também pode ir além dos programas de inovação aberta. É o caso do PagBank, por exemplo, que lançou recentemente um seguro empresarial em parceria com a Tokio Marine. A ideia é atender aos cerca de 6,5 milhões de clientes do banco digital que são comerciantes e empreendedores ativos.
O seguro é contratado diretamente pelos canais da PagBank, e se soma ao portfólio de serviços oferecidos pela instituição. Já a Tokio Marine passa a contar com mais um canal de distribuição dos seus produtos. “O seguro empresarial é um dos produtos mais aguardados pelos empreendedores de estabelecimento comercial físico de qualquer tamanho. Um dos diferenciais é a assistência 24h, que é completa e feita diretamente pela seguradora parceira, a Tokio Marine“, explica Fabio Herszkowicz, diretor executivo de Produtos e Serviços Financeiros do PagBank.
Soluções para o mercado
A própria CNseg tem apostado no desenvolvimento de soluções tecnológicas para suas associadas. Em 2023, a entidade quadriplicou os investimentos em tecnologia. Recentemente, a confederação adotou uma nova arquitetura de dados no modelo Data Lakehouse para impulsionar a escalabilidade.
“Disponibilizamos um portfólio composto por 30 soluções, que permitem que nossas seguradoras associadas otimizem e aprimorem seus processos de precificação, cotação, subscrição e regulação de sinistros, além de prevenir e combater fraudes”, explica André Vasco, diretor da CNseg.
A entidade também firmou parceria com a prefeitura do Rio de Janeiro para a oferta de cursos de especialização em tecnologia no contexto do setor de seguros. As aulas farão parte da grade oferecida aos alunos do “Programadores Cariocas”, projeto promovido presencialmente pelo Senac RJ.
Fonte: Startups