Tragédias como a do Rio Grande do Sul, ocorrida neste ano, quando apenas R$ 6 bilhões tinham seguro do total de R$ 89 bilhões em perdas estimadas, evidenciam papel do setor

 

Com o início do verão no Hemisfério Sul em 21 de dezembro, o Brasil entra em um período marcado por altas temperaturas e chuvas intensas. Segundo o Inmet, os volumes podem ultrapassar 400 mm em algumas regiões, trazendo riscos como alagamentos, quedas de granizo e ventos fortes. Esses eventos reforçam a necessidade de discutir os impactos financeiros das mudanças climáticas no país.

 

O exemplo mais recente é a tragédia no Rio Grande do Sul, onde as chuvas no outono de 2024 causaram perdas estimadas em R$ 89 bilhões, mas apenas R$ 6 bilhões estavam cobertos por seguros, segundo dados do setor. Isso representa uma lacuna de proteção de 93%, evidenciando o descompasso entre as perdas financeiras e o que é efetivamente indenizado pelas apólices (contrato de seguro) contratadas, aponta estudo recente feito pela Susep (Superintendência de Seguros Privados), órgão federal que regula e fiscaliza o mercado de seguros.

 

Em escala global, também existe uma lacuna de proteção, porém em uma proporção bem menor. Como comparação, o estudo apresenta que as perdas seguradas em um evento semelhante ao furacão Katrina, ocorrido nos Estados Unidos em 2005, que totalizariam US$ 60 bilhões contra US$ 175 bilhões de perdas econômicas – uma lacuna de proteção por seguros privados de nada menos que 65%.

 

Dados da Swiss Re mostram que as catástrofes naturais em 2023 causaram perdas econômicas de US$ 280 bilhões, com US$ 108 bilhões cobertos por seguros, ou seja, uma lacuna de proteção global de 61,4%. No Brasil, eventos como o furacão Katrina ilustram a gravidade desse problema, onde 65% das perdas não foram seguradas.

 

A lacuna de proteção brasileira, mais significativa que no exterior, reflete a baixa penetração do mercado segurador em coberturas voltadas a desastres naturais. “O Brasil tem um enorme potencial de crescimento para o mercado de seguros. O seguro precisa ser conhecido e, portanto, acessado pela população, reduzindo essa lacuna de proteção identificada pelo estudo. Precisamos de estratégias para alcançar e mobilizar esta grande capacidade de mercado que nós temos”, diz o superintendente da Susep, Alessandro Octaviani.

 

De olho na agenda climática

 

O volume total de pedidos de indenizações de seguros relacionados às enchentes no Rio Grande do Sul totalizou cerca de R$ 6,1 bilhões até o dia 4 de dezembro, segundo dados apurados pela CNseg (Confederação Nacional das Seguradoras). Em quantidade, as seguradoras registraram 57.638 avisos de sinistro desde o início de maio, com destaque para os seguros Residencial e Habitacional, que somaram 29.831 avisos, e o Automóvel, com 18.097.

 

Produto Quantidade Valor Automóvel 18.097 R$ 1.225.250.524,56 Residencial + Habitacional 29.831 R$ 594.160.972,13 Agrícola 1.358 R$ 167.161.332,11 Grandes Riscos (riscos nomeados e operacionais) 708 R$ 3.179.248.420,64 Outros 7.644 R$ 919.571.832,21 Total 57.638 R$ 6.085.393.081,64

 

“O setor de seguros é um dos mais impactados pela mudança climática porque assumimos riscos de várias obras, tem o agronegócio, etc. É uma pauta prioritária para o setor”, disse Dyogo Oliveira ao anunciar a jornalistas, neste mês, as projeções de desempenho do mercado segurador em 2024.

 

Segundo Oliveira, a CNseg tem intensificado seus esforços para ampliar o acesso ao seguro. A entidade já anunciou um projeto voltado para o tema durante a COP30, que ocorre no próximo ano em Belém. A CNseg irá promover a “Casa do Seguro”, um espaço dedicado à discussão de soluções climáticas e à conexão entre o mercado segurador e outros setores.

 

Entre os seguros que oferecem proteção contra enchentes estão o residencial, o automóvel e o rural. Dependendo da cobertura contratada, esses produtos podem indenizar danos causados por alagamentos e chuvas intensas (veja mais detalhes abaixo). Contudo, ainda há desafios para ampliar a adesão e incluir eventos climáticos como prioridade na contratação.

 

O mercado também aguarda avanços regulatórios para reduzir perdas financeiras e preparar o país para enfrentar eventos extremos cada vez mais frequentes. Uma das ideias é a criação de um seguro social de catástrofe, para atender a população afetada por desastres naturais, que deve ser discutido em 2025. A proposta original prevê indenização de R$ 15 mil a R$ 20 mil por residência afetada e transferida por meio do Pix de maneira automática ao segurado, ao custo de R$ 2 a R$ 5 mensais descontados diretamente na conta de energia elétrica.

 

Está em discussão também o custo passar a ser descontado na conta de celulares pós-pagos em vez da conta de energia, até por conta do alcance – estima-se que enquanto o número de brasileiros com conta de energia seja 70 milhões, há por volta de 110 milhões pagantes de celulares no modelo pós-pago.

 

Como funcionam seguros para enchentes?

 

De acordo com a Susep, os principais seguros que costumam cobrir os danos causados por enchentes (dependendo da cobertura contratada) são:

 

Seguro habitacional: tem por objetivo o pagamento das parcelas de dívida do segurado correspondente ao saldo devedor vincendo na data do sinistro relativa a financiamento para aquisição, reforma ou construção de imóvel, ou a reposição de tal imóvel financiado, na ocorrência de sinistro coberto. Por imposição legal, esse seguro deve obrigatoriamente contemplar pelo menos as coberturas para danos físicos ao imóvel provenientes de desmoronamento ou ameaça deste, total ou parcial, vendaval, destelhamento e inundação ou alagamento, ainda que decorrente de chuva; e morte e invalidez permanente. Todo consumidor que tenha um imóvel financiado pelo Sistema Financeiro de Habitação obrigatoriamente terá um seguro habitacional contratado.

 

Seguro de automóvel: as coberturas de casco no seguro de automóvel podem abranger, de forma isolada ou combinada, diferentes riscos a que esteja sujeito o veículo segurado, podendo incluir alagamentos e inundações.

 

Seguro residencial, condomínio e empresarial: o seguro compreensivo residencial é destinado a residências individuais, casas e apartamentos, habituais ou de veraneio. O compreensivo condomínio, por sua vez, é destinado à edificação ou ao conjunto de edificações, abrangendo todas as unidades autônomas e partes comuns, destinadas a fins residenciais ou não residenciais. Por fim, o compreensivo empresarial é destinado a atividades comerciais, industriais ou serviços, ou, ainda, a imóveis não residenciais.

 

Seguro rural: possui diferentes coberturas que podem garantir, a depender do que foi contratado, a atividade agrícola e pecuária, o patrimônio do produtor rural, seus produtos, o crédito para comercialização desses produtos, além do seguro de vida dos produtores. Geralmente, as seguradoras definem, em seus planos de seguro, coberturas básicas que devem ser contratadas. Assim, deve o segurado verificar se nas apólices consta a cobertura de eventos como chuva excessiva, alagamento, tromba d´água, ventos fortes, ventos frios etc. Caso as apólices sejam do tipo all risks, em que estão cobertos todos os riscos que não sejam expressamente excluídos, deve o segurado verificar se os eventos acima citados constam ou não da lista de riscos excluídos.

 

Seguro de transportes: garante ao segurado uma indenização pelos prejuízos causados aos bens segurados durante o seu transporte em viagens aquaviárias, terrestres e aéreas, em percursos nacionais e internacionais. De forma geral, costumam cobrir sinistros causados por fenômenos da natureza.

 

Fonte: InfoMoney – Online