Lei complementar deverá definir 3 pontos que podem afetar as seguradoras e, por tabela, os clientes. O texto da reforma tributária (PEC 45/2019) aprovado Câmara Federal e que aguarda a votação no Senado cria um Imposto sobre Valor Adicionado (IVA) composto por dois tributos: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI) e pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).

O primeiro substituiria três tributos federais: a Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS), a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e o Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI). Já o segundo substituiria o Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), de responsabilidade dos estados, e o municipal Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS).

De todos esses, as seguradoras são contribuintes diretas apenas de dois: o PIS e a Cofins. Se for levado em conta também as operadoras de planos de saúde, há ainda a incidência do ISS. Mas, de forma geral no caso das seguradoras, elas pagam de imposto (PIS e Cofins) ao governo uma alíquota de 4,65% tendo como base de cálculo a receita – que é o valor arrecadado nas vendas dos seguros aos clientes (prêmios) subtraído o valor pago em indenizações aos clientes (sinistros).

Segundo Alexandre Leal, diretor de Estudos e de Relações Regulatórias da CNseg (Confederação Nacional das Seguradoras), o modelo atual que vale para as seguradoras e outras instituições financeiras (como os bancos) é cumulativo.

Isso quer dizer que o seguro comercializado já vem com “Pis e Cofins” embutidos de outros produtos e/ou serviços adquiridos pelas seguradoras de empresas que em algum momento já pagaram ao governo a sua cota dessas duas contribuições, gerando um efeito cascata de uma taxa “reduzida”.

Porém, de acordo com Leal, o formato do texto da PEC 45 aprovado na Câmara cria a possibilidade de que o novo modelo de cobrança do imposto funcione de forma híbrida. Na prática, a companhia seguradora ficaria com um crédito ao adquirir produtos ou serviços que já tenham pagado o IVA, e poderia abater esse crédito do que ela precisaria pagar de IVA ao governo. “Por exemplo, a minha empresa de seguros, ela paga a conta de energia elétrica, de telefone, tem despesa de marketing, enfim, uma série de despesas que tem o IVA embutido. Do jeito que está a PEC, a princípio, seria não cumulativo para a gente, e o IVA que eu paguei nessas coisas, vou poder abater do IVA que eu vou dever para o governo”, exemplifica, reforçando que o atual texto aprovado na Câmara apenas abre essa possibilidade, que deverá ainda ser debatida em lei complementar.

“Vai ser discutido na lei complementar que os adquirentes do nosso produto não tomem crédito, não gerem o crédito para frente”, continua o diretor da CNseg. Se na proposta for permitido o uso desse crédito, poderá haver dois impactos diferentes: para a Pessoa Jurídica, será possível que ela abata do seu próprio IVA a pagar o que obteve em crédito ao adquirir algum seguro. Já para a Pessoa Física, não haveria essa possibilidade, uma vez que o produto termina ali com ela (que é o consumidor final), impossibilitando uma geração de crédito para abater posteriormente.

Em resumo, Leal observa que a lei complementar deverá definir três pontos principais que podem impactar as seguradoras e, por tabela, os consumidores de seguros:

Qual será a alíquota cobrada – que hoje é de pelo menos 4,65% em um esquema cascata;

Qual será a base de cálculo – continuará sendo a receita (valor arrecadado menos o valor pago em indenizações);

Haverá ou não geração de crédito para descontar no pagamento ao governo do IVA devido pelas seguradoras e clientes PJ – considerando os produtos/serviços adquiridos anteriormente.

“O que eu posso te dizer é que a PEC deixou essa possibilidade. Ruim seria se ela tivesse nos deixado, por exemplo, sem ter um sistema específico para a gente, por isso foi muito positivo. Essa é a grande notícia para o segurador, ou seja, que o governo é sensível às particularidades do setor”, pontua Leal.

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Na avaliação do advogado tributarista David Andrade Silva, sócio do Andrade Silva Advogados, o atual panorama trazido pelo texto que aguarda apreciação do Senado – que tem como foco apenas os impostos sobre consumo – ainda é muito incerto. Isso porque não se sabe ainda qual a alíquota que será aplicada na cobrança do IVA e nem se fato vai acontecer, já que dependerá da lei complementar.

“Se vier, por exemplo, uma alíquota de IVA de 25% para o mercado de seguros, isso representaria um desastre para o consumidor final, que pagaria no seguro 25% adicionalmente. Lembrando que estou falando só do tributo sobre o consumo [PIS e Cofins] de 4,65%, e o ISS municipal, que varia de 2% a 5%. Fora Imposto de Renda, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido [CSLL] e IOF [Imposto sobre Operações Financeiras], que não passam por essa reforma”, elenca o advogado.

Silva explica ainda que, para efeito comparativo, o setor financeiro em geral (onde se encaixam as seguradoras) já tem uma tributação diferenciada. Ele conta que enquanto as empresas em geral pagam 3,65% de PIS e Cofins, as seguradoras pagam 4,65%, ou seja, 1 p.p. a mais. Já a alíquota de imposto de renda das empresas em geral é de 15%, mas para as empresas financeiras é 25%. A CSLL tem alíquota de 9%, mas para o segmento de seguro é 15%. “E ainda tem o IOF que incide sobre seguro de vida, seguro saúde, seguro de bens, cada um com uma alíquota diferente, então é um mercado de fato muito onerado”, complementa Silva.

Para o advogado Thiago Amaral, sócio da área tributária do escritório Demarest, se de fato a alíquota do IVA chegar a 25%, o consumidor final vai sofrer algum efeito. Entre os desdobramentos que dependem de uma lei complementar, será justamente entender qual será o regime diferenciado designado ao rol de serviços financeiros (seguros incluídos), além dos serviços de saúde, submetidos a um tratamento mais benéfico do ponto de vista de alíquota. “Ele está dentro das possíveis reduções de alíquota. Eventualmente pode ter algum tipo de definição do que sejam os serviços de saúde, se os planos de saúde, por exemplo, estariam incluídos”, ressalta Amaral.

Outro ponto citado por ele é como fica a discussão dos planos de saúde sendo tributáveis pelo lSS, um tributo municipal. “A gente tem também um elemento relevante em relação à questão dessa reforma que é a da tributação no destino. Se hoje eu tenho uma atividade de venda de seguros e eu vou ter clientes Brasil afora, eu vou estar submetido a um sem número de alíquotas que eu vou ter que identificar do ponto de vista de onde está o meu adquirente”, pontua o advogado do Demarest.

De acordo com ele, ainda falta especificar quem seriam os adquirentes, mas pode ser um elemento dificultador. “O STF [Supremo Tribunal Federal] recentemente até analisou uma questão para fins de ISS que envolvia, entre outras atividades, operadoras de planos de saúde e administradoras de cartão de crédito, que visava deslocar a incidência do ISS para o destino. Isso foi julgado inconstitucional. E agora a gente está diante de talvez o mesmo regramento com o mesmo potencial de ter uma discrepância muito grande de tratamento em termos de fixação de alíquota”, continua Amaral. O elemento complicador estaria no fato de que, segundo a reforma, apesar da existência de alíquotas-padrão, estados e municípios poderão definir as suas próprias alíquotas, distintas entre si, dentro dessa lista de referência.

O que esperar dos próximos passos da tramitação da reforma?

Em relação à próxima etapa da tramitação da reforma tributária, que é a discussão no Senado, a expectativa da CNseg é conseguir incluir na proposta pleitos que não foram contemplados na Câmara. Um deles seria justamente a isenção do IOF, um imposto recolhido pela seguradora, mas que acaba incidindo no preço final do seguro. Por exemplo: se valor do seguro é hipoteticamente de R$ 100,00, o consumidor acaba pagando R$ 107,38 – já que R$ 7,38 é referente ao IOF. E nesse caso vale tanto para clientes pessoa física quanto jurídica.

Leal explica que os seguros gerais (coberturas voltadas para bens e responsabilidades) têm o IOF de 7,38%, mas essa alíquota pode variar:

0 para seguro garantia;

0,38% para seguros de vida;

2,38% para saúde.

Por enquanto, a expectativa dos especialistas consultados pela reportagem é a de que nada mude na prática pelo menos até o próximo ano, já que no segundo semestre os esforços deverão estar concentrados na aprovação da PEC no Senado, para avanço do conteúdo da lei complementar.

 

Fonte: CNseg