Já se passaram 16 anos desde a edição da Lei nº 9.656, de 1998, que regulou amplamente os planos e seguros de saúde, e o setor ainda enfrenta muitos desafios e incompreensões da sociedade. O noticiário permanece palco de controvérsias sobre o padrão de atendimento prestado por operadoras privadas, em universo com mais de 1.200 empresas que oferecem coberturas de saúde para perto de 50 milhões de brasileiros – aproximadamente 26% da população que habita o território nacional. Mais recentemente, a imprensa passou a se debruçar sobre um fenômeno que preocupa autoridades, empresários e beneficiários de planos. Trata-se dos custos médicos, que sobem à estratosfera, ameaçando a sustentabilidade de segmento da economia que, no fim de 2013, movimentava mais de R$ 91 bilhões em procedimentos de saúde – de consultas médicas a cirurgias de altíssima complexidade, passando por exames diagnósticos os mais variados.
Nesse contexto, poucos atentam para o fato de que a indústria da saúde privada – que tem forte contribuição em investimentos e na geração de emprego e renda – exerce o mesmo peso, no desempenho da economia, da cadeia produtiva automobilística, que conta sistematicamente com o suporte governamental. Isso só para citar um exemplo. Sem falar em outro elo da cadeia de valor da saúde, a indústria farmacêutica, que, igualmente, desperta interesse dos gestores da política macroeconômica, também por sua importante participação na vida econômica e social de um Brasil que ocupa lugar expressivo no cenário mundial.
Mas voltemos à questão dos custos da moderna medicina, que impactam sobremaneira os preços dos planos de saúde e comprometem parcela cada vez maior do orçamento de empresas – os empregadores –, que, atualmente, representam 75% dos compradores de coberturas médicas e hospitalares, e de famílias que também recorrem à saúde privada. A chamada “inflação médica” há muito tempo já superou a barreira anual de dois dígitos. Há projeções, feitas a partir de cálculos da Agência Nacional de Saúde Suplementar, demonstrando que a necessidade atuarial de reposição do poder de compra dos planos chegou, em maio de 2014, a uma média ponderada de 15%. Isso contra uma inflação geral de preços não maior do que 6,5%. Esse é o tamanho do desafio que o setor e a sociedade enfrentam.
Para equacionar a problemática – e ir além do noticiário que, paradoxalmente, alardeia parcela cada vez menor de operadoras de saúde com problemas de atendimento –, basta olhar para o norte, na direção da experiência recente do Obamacare. No país de Barack Obama, a inflação médica é menor do que a inflação geral de preços. Mágica dos democratas, que empenharam seu capital político a fim de viabilizar a cobertura universal da medicina para os norte-americanos? Não, o que diferencia os modelos legais da saúde privada americana e brasileira é a coparticipação financeira dos segurados nos gastos da saúde privada. Ao serem obrigados a mexer no bolso a cada tratamento indicado, os cidadãos, nos EUA, transformaram-se em fiscais ativos e efetivos das despesas que lhes são repassadas por meio dos planos de saúde. Assim, vêm reduzindo custos de diagnósticos e cirurgias, comportamento alcunhado de “consumerismo” – mas bem diferente do consumerismo brasileiro exercido pelas autodenominadas organizações não governamentais que buscam representar o consumidor na defesa de seus direitos.
No Brasil, ainda varremos a poeira para baixo do tapete, ao pedir mais e mais regulação e fiscalização governamental para dobrar a curva ascendente dos custos médicos. Estamos tentando adaptar à nossa realidade o consumerismo americano, pela introdução do “VGBL Saúde” – um modelo de plano com capitalização que permitiria aos brasileiros custear despesas de saúde na idade mais avançada, quando a pessoa tem reduzida sua capacidade de gerar renda. Mas esse projeto está parado na mesa das autoridades. É hora de romper paradigmas, para sustentar o próprio futuro da saúde privada.
Marcio Serôa de Araujo Coriolano é presidente da FenaSaúde
Fonte: CNseg